A CASA

olhos tão pequenos para a noite
duas janelas colhendo ausências
tudo que a arte criou no sótão
arabelas debruçadas em páginas azuis
descobrir as asas do esquecimento
luas branqueando tipos móveis
caravelas loucas roucas de desespero
na sala, um piano verde move-se nu
um quebra-cabeça suplica paciência,
uma fada cuida e espera na suíte
protheus tomou forma de fauno
transpôs as cortinas
o leito virou mar de madre-pérola
era uma vez manhãs-de-espelhos
que sala torta ascestral
comporta satie e nuvens
poesia e areias... um quintal
formigas devastando ampulhetas
cisnes argumentando candelabros
duas almas cabiam nesta casa
uma azul, outra cor-de-vento
elas tropeçavam em pinoccios ateus
amontoavam-se pela copa
um armário sonolento
a porta aberta à rua
duas portas redondas
corações circundantes
na soleira de passos-mármores
gepetto criou alma na amoreira
fábulas de isopor
era uma casa de aurora...