Entre vieiras e naufrágios
Pisava apenas os ladrilhos imitando conchas, eu que fui marujo de nau e capitão. Molhava os pés para saber o mar; ia ao mar a desejar as ilhas perdidas nas estantes. Nas brochuras escondia as procelas e barquinhos de papel. Porém um naufrágio suplantou o gesto do leme das horas noturnas. Era o chão tornado de conchas e areia e musgo e estrelas. Meu corredor deu a desaguar nos Bálcãs de corações aflitos de almas. Margarida veio saindo do mar apagando os faróis. Aparição de santa perseguindo a lua. Margarida quedou-se muda nas ondas que amoleceram à deriva do sonho.
Antes do naufrágio, Acrísio de Deus, pescador desde menino que mal sabia além da cartilha, deixou esses versos que acabaram nas mãos do tabelião — homem dado às letras, de grande pendor poético, e viu naquele texto a impressionante capacidade de engarrafar o infinito. O tabelião cerrou-o numa garrafa vazia de bordeaux lançando-a ao mar.
Acrísio hoje lustra assoalhos e aspira cortinas no Grande Hotel, mantém lustrosos sempre os ladrilhos imitando conchas.
Antes do naufrágio, Acrísio de Deus, pescador desde menino que mal sabia além da cartilha, deixou esses versos que acabaram nas mãos do tabelião — homem dado às letras, de grande pendor poético, e viu naquele texto a impressionante capacidade de engarrafar o infinito. O tabelião cerrou-o numa garrafa vazia de bordeaux lançando-a ao mar.
Acrísio hoje lustra assoalhos e aspira cortinas no Grande Hotel, mantém lustrosos sempre os ladrilhos imitando conchas.
0 Comments:
Post a Comment
<< Home